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27.02.2012 - "Agora será um novo patamar para a comunidade. Não tem mais o capital do tráfico", entrevista com o Agente de Crédito da favela da Rocinha, Diogo Ferreira

27/02/2012

Com uma carteira ativa de R$ 1 milhão liberados para os pequenos negócios da favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, o programa nacional de microcrédito produtivo e orientado torna-se um dos pilares fundamentais nesta etapa de transição da comunidade.


Levar os recursos do microcrédito aos moradores da favela da Rocinha (considerada uma das maiores do Brasil e da América Latina, com 100 mil habitantes) São Conrado e Vila Canoas, no Rio de Janeiro, este é o trabalho de Diogo Ferreira, assessor de crédito do Crediamigo/ Vivacred que esteve de passagem pelo Banco do Empreendedor. A visita de cortesia ocorreu no começo de fevereiro (10).


Em 2010 o diretor-superintendente do Banco, Luiz Carlos Floriani, o gerente Wilson Dutra e a agente de crédito Adriana visitaram a agência da Crediamigo, localizada no interior da favela e conheceram o profissional. De férias em Balneário Camboriú, foi a vez de Diogo conhecer de perto o trabalho de uma das maiores organizações de microcrédito de Santa Catarina e rever os amigos.


A Rocinha está localizada entre os bairros da Gávea e de São Conrado (uma das regiões que apresenta o IPTU mais alto da cidade), na zona sul do Rio de Janeiro. A proximidade das residências de classe alta desses dois bairros e as de classe baixa da Rocinha marca um profundo contraste urbano na paisagem da região, que é frequentemente citado como símbolo da desigualdade social do Brasil. No dia 13 de novembro de 2011, a Rocinha foi cenário de uma grande operação conduzida pelas forças armadas brasileiras e pelas polícias do estado. O objetivo foi a retomada do território das mãos dos traficantes de drogas, visando preparar o terreno para a futura instalação da vigésima Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da cidade.


Segundo Diogo, com a pacificação e o fim do comércio de drogas a Rocinha sofreu um baque econômico e aos poucos o incremento do turismo na região começa a trazer novo fôlego aos pequenos negócios praticados na comunidade.


"O cara ia lá consumir droga mas se alimentava, bebia, jogava nas máquinas de caça níqueis, que são ilegais. Isso tudo rendia um grande capital de giro. O traficante gastava na comunidade. A esposa do traficante comprava roupas, cosméticos, tudo dos nossos clientes. Com a pacificação muitos deles foram embora ou foram presos e esse dinheiro já não gira mais. Então agora será um novo patamar para a comunidade. Não tem mais o capital do tráfico. Agora vai ter muito mais turista circulando por lá. Vai mudar o público e nós esperamos que esse novo público seja tão forte quanto o anterior, que ia lá fazer outra coisa e não visitar e conhecer a vida na comunidade", explica.


Hoje são realizadas cerca de 70 operações de microcrédito por mês. Em fevereiro de 2009 o modelo de atendimento, baseado em empréstimos individuais, foi diversificado e atualmente 80% das liberações são direcionadas aos grupos solidários. Diferente dos empréstimos individuais, onde a concessão de crédito precisa da garantia de um ou mais avalistas ou um bem móvel (carro ou moto), esta modalidade atende um segmento da população mais carente que não possui nenhum tipo de bem para oferecer como garantia real, a não ser o compromisso de aval mútuo entre o grupo.


“O grupo solidário é avaliado pela amizade dos participantes. A gente trabalha muito forte a renovação. Nosso foco principal são os clientes que trabalham em casa, como costureiras e vendedoras de cosméticos”, esclarece.


Atualmente há 59 grupos ativos na comunidade, com 4 clientes cada. De acordo com o profissional, a inadimplência é inexpressiva e oscila entre 0,8% e 1% . O crédito, concedido à um ticket médio de R$ 892, possui prazo máximo de quitação de 6 vezes e é direcionado para compra de mercadorias, não podendo ser utilizado para outros fins.

Outros seis assessores de crédito também atuam na Rocinha. Cada um possui uma média de 200 clientes, totalizando cerca de 1.150 clientes ativos na atualidade. Suas carteiras somadas correspondem a R$1 milhão de reais investidos nos pequenos negócios da comunidade. Os profissionais também fazem crédito individual para a compra de mercadorias, crédito individual para obras e compra de equipamentos.

  

Localizada entre os bairros da Gávea e de São Conrado a Rocinha abriga 100 mil habitantes.

 

Entrevista:  "Agora será um novo patamar para a comunidade. Não tem mais o capital do tráfico", entrevista com o Agente de Crédito da favela da Rocinha, Diogo Ferreira


Como você conheceu o trabalho do Banco do Empreendedor?

Em 2010 o presidente do Banco do Empreendedor, Luiz Carlos Floriani, o gerente Wilson Dutra e a agente de crédito Adriana visitaram nossa agência no Rio de Janeiro e agora estou aqui, passando as férias em Camboriú, e entrei em contato com a unidade para conhecer o trabalho do Banco do Empreendedor e rever os amigos. 
 

Você nasceu na Rocinha?

Eu nasci e cresci na Rocinha, morei lá até os meus 16 anos. Depois sai e fui morar num bairro chamado Jacarepagua. Em 2007 eu retornei para trabalhar como assessor de crédito, por ter conhecimento da região. Na minha infância o tráfico tinha um poder muito menor.


Após a pacificação, como tem sido trabalhar numa das maiores favelas da América Latina?


Modificou bastante pra gente. Com a pacificação a Rocinha teve um baque econômico. Primeiramente com a falta de público que havia antes e que agora não tem. Tinha muita festa, baile funk, pessoas iam lá consumir drogas e agora com a pacificação isso não tem acontecido mais. Com a pacificação o comércio caiu bastante neste final e início de ano. Mas já vem trazendo vantagem pra gente que é a legalização. As pessoas estão procurando se legalizar. Foram 40 anos no poder do tráfico e com a pacificação muita gente está buscando se adaptar ao novo modelo e melhorando os seus negócios o que acaba abrindo novas portas para o nosso trabalho de assessor de crédito. No início foi muito ruim. Mês de novembro e dezembro foram os piores meses para o Crediamigo na Rocinha.


Por que foi tão ruim?

Girava muito dinheiro no tráfico de drogas. Segundo os jornais eram 8 milhões por mês. Os comerciantes da localidade acabavam, de certa forma, se beneficiando, porque o cara ia lá consumir droga mas se alimentava, bebia, jogava nas máquinas de caça níqueis que são ilegais, isso tudo rendia um grande capital de giro. O traficante gastava na comunidade. A esposa do traficante comprava roupas, cosméticos, tudo dos nossos clientes. Com a pacificação muitos deles foram embora ou foram presos e esse dinheiro já não gira mais. Então agora será um novo patamar para a comunidade. Não tem mais o capital do tráfico.

 

Quais as perspectivas de melhorias?


Como a rocinha está na Zona Sul do Rio de Janeiro e é uma favela muito conhecida, o turismo vai aumentar bastante. Tanto que já foi escolhido um presidente da associação de turismo da Rocinha. Tinha muito turista que circulava por lá e agora vai ter muito mais. Vai mudar o público e nós esperamos que esse novo público seja tão forte quanto o anterior, que ia lá fazer outra coisa e não visitar e conhecer a vida na comunidade.


Quais os negócios que vocês financiam?

Na Rocinha nós trabalhamos muito forte o comércio de bebidas e alimentos. Lá há muitas pensões, restaurantes, cantinas, tem muito bar principalmente na área em que atuo, a parte baixa, que é a região onde costuma ter eventos com música ao vivo na comunidade. Também trabalhamos muito forte com clientes que trabalham em casa, como costureiras, vendedoras de cosméticos. Este é perfil de cliente que focamos muito na Rocinha e no Crediamigo, no nordeste.


Como era trabalhar em uma comunidade comandada pelo narcotráfico?

Pra gente não tinha muita diferença até porque trabalhávamos uniformizados, com crachá, tudo certinho. Nunca sofri nada em termos de alguém chegar e falar outra coisa. Agora, por incrível que pareça, está mais perigoso. Porque como não há mais o poder do tráfico e a polícia ainda não subiu de vez ainda há uma tensão maior. Estão ocorrendo muitos assaltos, muitos problemas e a segurança hoje ficou mais fraca do que antes. Temos clientes sendo assaltados por conta dessa situação. Não há ainda uma UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) na Rocinha. Ela só chega em março. O poder do tráfico não nos afetava. Era normal.


Vocês são em quantos assessores e qual o número de clientes que atendem?

Hoje na unidade da rocinha somos em seis assessores de crédito, temos 1.150 clientes ativos e um montante de R$1 milhão de reais emprestados. Cada assessor possui uma média de 200 clientes.


Qual a modalidade de operação de microcrédito mais comum na Rocinha?

Oitenta por cento das operações na Rocinha são em Grupo Solidário. Há ainda muito crédito individual porque de 1997 até 2009 a região era atendida somente com esse tipo de crédito. A partir de fevereiro de 2009 iniciou-se os trabalhos com os grupos solidários. Então a própria reformulação do Crediamigo (uma instituição do Banco do Nordeste) e a parceria com o Vivacred e sua aplicação na Rocinha proporcionaram este quadro, onde 80% das operações atualmente são formuladas através de grupos solidários.


Como anda a inadimplência?

A inadimplência na Rocinha tá variando por volta de 0,8 no máximo 1%. Com essa metodologia do grupo solidário os assessores de crédito trabalham fortemente a solidariedade de grupo para que um pague pelo outro e para não ocorrer inadimplência. Eu assumi a carteira em setembro de 2009 e só tive dois casos até hoje em que o cliente realmente não pagou o crédito. Consegui recuperar um deles agora, em janeiro. Então, de setembro de 2009 até hoje eu só tive um caso realmente que não teve como o cliente quitar.


Como ocorre o processo de cobrança dos inadimplentes?


É o próprio assessor de crédito quem cobra. Nós contatamos o coordenador do grupo solidário responsável pelo carnê. Fazemos isso após um dia de atraso. Atrasou um dia, logo pela manhã, o assessor de crédito tá ligando ou o administrativo da agência, para perguntar o que aconteceu. Depois de levantar as informações, o próximo passo é marcar uma reunião do grupo solidário para descobrir quem está em falta e qual a posição dos outros. Nesta reunião que fazemos no segundo ou no terceiro dia de atraso já estipulamos uma nova data de pagamento, para que os que tenham o dinheiro ajudem aquele que não tem ou aquele que não tinha ajude o grupo a pagar. 


Fontesul Assessoria de Comunicação